terça-feira, janeiro 10, 2006

DORIANA E COLGATE

Hoje fui confrontado com dois arautos incontestáveis da falta de dinheiro. O pote de margarina e o tubo de pasta de dente jogaram-me na cara seus pedidos de aposentadoria: “Por favor, envie-nos para o asilo do lixo seco”. Ao mesmo tempo, me permitiram dar vazão ao meu lado sádico, já que foi preciso raspar e apertar, e fazê-lo com dois instrumentos que poderiam muito bem ser usados em verdadeiras sessões de tortura: uma faca e uma escova de dentes.Raspei e apertei para não comer pão puro e não dormir com tártaro (embora eu esteja nele, se carregarmos nas tintas do melodrama ao descrever o meu atual contexto fiscal). Eu podia colocar aqui referências internéticas a técnicas de tortura com lâminas serrilhadas ou diferentes interpretações do conceito de tártaro. Ou ainda descrever minhas idéias sobre como causar dor a um ser humano com uma escova de dente. Poupá-los-ei.Vou me restringir a comentar essa percepção, concentrada e portanto aparentemente nova, que tive do poético que há na alimentação e na higiene pessoal cotidianas, esses rituais universais que nos lembram, assim como nos fazem esquecer, por sua inserção na rotina, o prazer de valorizar as pequenas coisas domésticas, que ocupam um espaço ínfimo no orçamento, mas fazem uma falta imensa quando acabam. Só isso.Mas fiquem tranqüilos, a situação não é tão terrível: no dia seguinte, havia fundos para adquirir outra Doriana e outra Colgate Tripla Ação! Estou bem alimentado e sem medo de sorrir!